O Conselho Nacional de Justiça publicou o Provimento n. 196 , o qual define regras para o processamento de busca e apreensão e consolidação de propriedade de bens alienados fiduciariamente por meios extrajudiciais, nos Ofícios de Registro de Títulos e Documentos.
O provimento regulamenta os procedimentos previstos na Lei n. 14.711/2023 (marco legal das garantias), que alterou o Decreto-Lei n. 911/1969, permitindo que credores fiduciários realizem a busca e apreensão de bens móveis sem necessidade de ação judicial.
O Provimento n. 196 estabelece critérios para a realização do procedimento de busca e apreensão por meio extrajudicial, como a existência de cláusula expressa no contrato de alienação fiduciária, a comprovação da mora do devedor e a necessidade de notificação prévia. Além disso, preserva o direito do devedor de contestar irregularidades na via judicial, garantindo o contraditório e a ampla defesa.
Reflexos no Agronegócio
A medida terá larga aplicação no setor do agronegócio, especialmente no que diz respeito a veículos (carros, caminhonetes, caminhões) e maquinários agrícolas utilizados pelos produtores rurais — como tratores, colheitadeiras, pulverizadores, entre outros — frequentemente adquiridos por meio de financiamentos com garantia fiduciária.
A regulamentação surge em um momento de grande turbulência no crédito rural, provocado por intempéries climáticas e pelo aumento expressivo dos pedidos de recuperação judicial por parte de produtores. Nesse contexto, o novo regramento estabelecido pelo Provimento CNJ nº 196/2024 busca conferir maior agilidade e segurança jurídica aos credores, especialmente em relação à recuperação de bens móveis financiados que são utilizados para a produção agropecuária.
Conforme destaca o advogado e professor Wendell Brito (@wendeldebrito), autor da obra Alienação Fiduciária de Bens Imóveis:
“O Provimento 196 do Conselho Nacional de Justiça veio regulamentar parte do Marco Legal das Garantias que, por sua vez, é uma das legislações que tem por objetivo promover a desjudicialização, ou seja, para resolver algumas situações sem atuação prima face do Poder Judiciário. O Provimento 196 vai ter grande impacto no agronegócio porque abrange bens móveis como semoventes, maquinários, implementos agrícolas e outros que poderão ser objeto de busca e apreensão ou reintegração na posse sem a necessidade de o credor se socorrer do Poder Judiciário, pois tudo vai ser feito via cartório. Apesar de estar transferindo para o mecanismo extrajudicial, até mesmo a retomada desses bens não impede que a parte vá ao Judiciário questionar alguma ilegalidade envolvendo o procedimento e, além disso, o que tem de diferente é que antes o credor dependia de autorização do Judiciário para ter acesso à posse desses bens e com o Provimento 196 o credor não mais necessitará do Judiciário, o qual atuará apenas de forma excepcional.“
Na opinião do advogado agrarista Francisco Torma (@franciscotorma), “O Provimento n. 196 é um golpe duro para o produtor, já que seu maquinário, essencial à produção, pode ser tomado de forma extrajudicial. Um revés financeiro, e do dia para a noite, seus bens mais valiosos podem sumir. Essa nova regra expõe o produtor a uma perda abrupta e desastrosa, jogando uma sombra de insegurança constante sobre quem já lida com os riscos do campo e da agrariedade.“
Para o advogado Guilherme Medeiros (@advogadorural):
“No contexto do agronegócio, o impacto é ainda mais preocupante: tratores, colheitadeiras e implementos agrícolas essenciais à produção rural passam a ser passíveis de retirada sumária, sob mera iniciativa administrativa do credor. Isso viola princípios constitucionais de função social da propriedade (art. 186, CF), da ampla defesa (art. 5º, LV, CF) e da dignidade econômica do produtor.
Embora a normativa preveja o direito ao contraditório posterior, trata-se de garantia ilusória frente ao dano irreparável decorrente da perda imediata da posse de bens produtivos. A medida, além de questionável em termos constitucionais, potencializa abusos bancários, amplia a insegurança jurídica no campo e ignora a realidade da atividade agrícola, que depende diretamente desses bens para a subsistência familiar e cumprimento de obrigações financeiras futuras.
A reação técnica e institucional precisa ser imediata, com atuação coordenada de advogados, entidades de classe e do próprio Ministério Público, para frear a aplicação indiscriminada dessa norma no meio rural.”
O advogado Albenir Querubini (@albenirquerubini) ressalta que, “nas hipóteses de endividamento decorrente de frustração de safra, os produtores rurais podem ter assegurados os direitos à prorrogação de dívidas conforme o Manual de Crédito Rural (MCR). Além disso, é possível recorrer a medidas de renegociação, desde que essas providências sejam adotadas antes do vencimento da dívida garantida por alienação fiduciária“.
A observação reforça a importância do planejamento financeiro e da atuação preventiva dos produtores, especialmente diante do novo cenário trazido pela regulamentação da busca e apreensão extrajudicial de bens móveis, que amplia a efetividade da execução das garantias pelos credores.
Sobre as máquinas agrícolas, cabe lembrar que a Lei nº 13.154/2015 havia acrescentado o parágrafo 4º-A ao art. 115 do Código de Trânsito Nacional – CTN (Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997) dispondo sobre o Registro Nacional de Tratores e Máquinas Agrícolas (RENAGRO) em cadastro específico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Atualmente, o RENAGRO é feito através da Plataforma ID Agro Máquinas (IDAGRO): https://www.idagro.com.br/.
(* Texto foi elaborado utilizando-se de trechos da notícia da Agência CNJ de Notícias: “CNJ regulamenta busca e apreensão extrajudicial de bens móveis“, publicado em 05/06/2025, disponível em: https://www.cnj.jus.br/cnj-regulamenta-busca-e-apreensao-extrajudicial-de-bens-moveis/).